Há cerca de uma década, com a descoberta da minha primeira gravidez, decidi regressar a Portugal, após uma experiência profissional em Angola (o meu marido viria depois, quando nos conseguíssemos equilibrar financeiramente). Nessa mesma altura, sem que o tivéssemos previsto, a moeda do país (kwanza) deixou de poder sair do território e ser trocada por euros. Resumidamente, aquilo que tínhamos conquistado em Angola não tinha qualquer valor, nem nos salvaria nesta fase. Sem termos uma casa, nem nenhum tipo de bem em Portugal (havíamos emigrado imediatamente após a minha conclusão do curso), ficámos sem nada, isto num momento em que nos preparávamos para receber a nossa primeira filha.
Quando a nossa filha entrou para creche, mais de um ano depois, iniciei a procura por um estágio profissional, obrigatório para pertencer à Ordem dos Psicólogos Portugueses. Foi aqui que me confrontei com uma realidade para a qual não estava preparada: em todas as entrevistas, era notório o ar de desânimo do outro lado sempre que me perguntavam se tinha filhos e eu respondia afirmativamente.
Ter de começar do zero, com um de nós desempregado, sem fundo de maneio, e com um bebé nos braços, foi dos maiores desafios com que já lidámos; passámos grandes dificuldades nessa altura, ao ponto de faltar o básico. Apesar disso, eu sabia que amava a minha área (psicologia) e, assim como as pessoas à minha volta, acreditava no meu potencial, o que me levava a continuar a lutar.
Corri muitos sítios, bati a muitas portas, fui rejeitada uma e outra vez, sempre pelo mesmo motivo – ser mãe. Movida pela necessidade de dar voz a tudo aquilo que vivia e simultaneamente ser para alguém o colo que me faltava, criei a página 3m’s – Menina, Mulher, Mãe, que foi crescendo mais do que alguma vez imaginei.
Após finalmente ter conseguido um local para estagiar, aconteceu algo inesperado – começaram a chegar cada vez mais pedidos de acompanhamento, especificamente para mim. Quando iniciei a prática clínica, tinha uma lista de espera praticamente construída que, ao longo do tempo, continuou a aumentar.